sábado, 16 de janeiro de 2010

Auto-estima: como se forma nossa auto-imagem? Parte um: educação


Diversas são as pessoas que, em terapia, se queixam de sintomas depressivos tais como baixa auto-estima. Algumas dessas pessoas trazem um histórico de rejeições e insucessos que parecem bastante associados à maneira como enxergam a si próprias, percepção esta nem sempre condizente com suas reais potencialidades e fraquezas. Seu discurso está geralmente repleto de auto-depreciações que não se justificam com base em seus argumentos ou nas qualidades que nelas podemos identificar. Esses sintomas nos fazem pensar em como se forma a imagem que temos de nós mesmos e no quanto ela pode afetar nossas atitudes e comportamentos.
Nossa auto-imagem começa a se construir muito cedo em nossas vidas, desde as primeiras relações com a figura materna (independentemente aqui de quem ocupa essa função na vida de uma pessoa, seja sua mãe biológica ou não). Todos nós adultos tendemos a projetar nas crianças aspectos de nossa própria infância; quando nos relacionamos com elas, acabamos por tratá-las (consciente ou inconscientemente) como gostaríamos de ter sido tratados naquela etapa da vida. Outras vezes, por inveja, atacamos uma criança por ela ser ou ter características e condições que nós não tivemos. Isso acontece freqüentemente com babás que violentam crianças indefesas; algumas dessas mulheres, seja por sua condição social e econômica ou por outros fatores, não tiveram um histórico infantil saudável e prazeroso, mas uma infância que foi marcada por traumas e outras dificuldades. Quando se deparam com crianças que possuem pais amorosos ou preocupados, uma casa confortável, e outras satisfações, bajulações e comodidades, irritam-se, e por inveja, atacam a criança. Noutras vezes ainda, despejam a violência recebida pelos pais contra elas, durante a infância, nas crianças das quais são responsáveis. Esses exemplos ilustram um pouco de como as crianças nos remetem à nossa infância, despertando comportamentos os mais variados.
Mas essa projeção que os adultos fazem de aspectos da sua infância em outras crianças acontece principalmente quando somos pais. A infância de nossos filhos nos remete, de um modo ou de outro, à nossa própria infância; nos nossos filhos, idealizamos muitas das perfeições e dos sonhos que não pudemos realizar quando crianças. Desejamos que sejam melhores do que nós, que realizem o que não pudemos. Queremos lhes oferecer os brinquedos que não tivemos, os passeios que não tivemos, etc. E se não tivemos nada disso, podemos também pensar que nossos filhos devem igualmente ter acesso a poucas coisas, e lutar por sua própria conta para alcançarem o que desejam. Às vezes, damos-lhes todo o limite e repreensão que não tivemos de nossos pais; em outras, damos-lhes pouco limite e afrouxamos demais, assim como esperávamos que fosse a nossa infância (ou como ela de fato foi). Enfim, a educação de nossos filhos dependerá sempre de como aceitamos ou rejeitamos certos aspectos da educação de nossos próprios pais, do quanto vamos ou não manter, em nossa própria conduta, a educação que nos deram.
Considerando estas questões, vemos que a nossa auto-imagem depende também de como seremos vistos pelos nossos pais, e pelas outras pessoas. Quando nascemos, não fomos ainda socializados... estamos ainda à espera de educação. A maneira como vão nos tratar, se vão nos dar carinho, ou nos rejeitar, tudo isso determinará, em grande parte, o modo como trataremos a nós próprios, o quanto gostaremos de nós mesmos. Esse critério, em última instância, não é universal, mas subjetivo. Existem crianças que, mesmo sob uma série de adversidades familiares, sentem-se amadas e protegidas. E isso condicionará fundamentalmente a capacidade delas de se amarem e se protegerem quando se tornarem adultos, e não puderem mais recorrer ao colo dos pais.
Quando os pais criam a respeito dos filhos, uma imagem muito idealizada que não condiz com aquilo que os filhos são, ou quando os pais esperam dos filhos atitudes e comportamentos que os mesmos não correspondem, os pais tendem a rejeitá-los, de um modo ou de outro, de formas mais ou menos diretas, mais ou menos sutis, e a criança é capaz de perceber isso, em pequenos comportamentos e diferenças dos pais. É um grande mito acharmos que criamos a todos os nossos filhos do mesmo jeito; cada filho nasce numa época diferente, desenvolve características de personalidade diferentes, passa por processos de socialização diferentes (dependendo se é menino ou menina, se é o irmão mais velho, do meio, e assim por diante, dependendo dos seus traços físicos e predisposições, de alguma doença ou deficiência física ou mental, etc.). Enfim, os fatores que determinam a personalidade são muitos. E as crianças percebem que os pais os tratam de modo diferenciado, ora favorável, ora desfavoravelmente. Tudo isso influirá na auto-imagem, de muitas formas. A rejeição costuma criar um círculo vicioso, no qual o indivíduo tende a gerar nas pessoas uma tendência a rejeitá-lo sempre de novo, pela piedade que sentem em relação a ele, e pela ausência de amor próprio que sentem emanar dele. Por não se amar, não consegue ser amado pelos outros.
A capacidade de se respeitar, de se perdoar, e mesmo de amar... esses sentimentos são, em parte, construídos pelo ser humano. Embora todo ser humano busque o seu semelhante, de modo a garantir sua sobrevivência, o amor e o respeito socialmente compartilhados são atitudes aprendidas, e não dons inatos! Um bebê se sente bem com o carinho que recebe, mas se houver complicações graves na sua relação com a figura materna e com outros seres humanos, o indivíduo pode não aprender direito como amar e doar carinho. Ele vai sempre esperar do outro, mas não vai aprender a fazer sua parte. O amor que damos depende significativamente do quanto recebemos de amor; assim com o respeito, a estima, e tudo mais.
Muitos outros fatores interferem na auto-imagem, e os discutiremos melhor nas próximas postagens.